O Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação trabalha em um plano para desenvolver a computação quântica no Brasil, com uma proposta de investimento público e privado de R$ 5 bilhões até 2034.
O projeto deve ser oficializado por meio de portaria entre maio e junho, de acordo com o coordenador de fomento à inovação da pasta, Ulisses Martins Rosa.
Uma tabela apresentada pelo coordenador do MCTI nesta segunda-feira (14) indicava destinação de R$ 3 bilhões até 2029, sendo R$ 1,7 bilhão em infraestrutura, R$ 300 milhões em formação, R$ 500 milhões em sensoriamento e R$ 500 milhões em processamento. Os R$ 2 bilhões restantes seriam investidos entre 2030 e 2034.
A computação quântica, que simula características quânticas da matéria, pode acelerar a resolução de problemas complexos, de solução inviável nos atuais computadores, nas áreas de inteligência artificial, criptografia, farmácia, logística e economia, entre outras.
No entanto, os qubits, o equivalente aos bits nas máquinas clássicas, são muito instáveis e precisam de condições quase ideais para funcionar. Por isso, é necessário isolar o computador em locais com temperatura próxima ao zero absoluto (-273 graus celsius), onde não há incidência de luz e ondas de rádio.
Hoje, o Brasil tem apenas computadores quânticos de propósitos pedagógicos —um na Universidade Federal do Pernambuco (UFPE) e outro no Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), em São Paulo.
Para o fundador da Dobslit, uma das primeiras startups brasileiras a trabalhar com computação quântica, o plano ainda precisa equilibrar melhor os valores destinado à infraestrutura e às pessoas. “O risco é não existir gente para usar esses laboratórios, fazer manutenção adequada; não adianta apresentar equipamentos de ponta sem ter um ecossistema.”
De acordo com ele, isso se resolveria com o amadurecimento de um ambiente de negócios em torno da tecnologia. “É o que vemos no Sirius [o acelerador de partículas do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), onde diferentes empresas e grupos de pesquisas usam e dão sentido àquela estrutura.”
“A iniciativa privada precisa que o governo aceite dividir os riscos de fazer ciência quântica”, afirma o engenheiro de software do Instituto Eldorado Mateus Silva Pierre. Hoje, de acordo com ele, ainda é difícil convencer as empresas a investir na tecnologia.
Sem infraestrutura, os brasileiros que trabalham com computação quântica precisam recorrer aos provedores de nuvem equipados com qubits, como a AWS (Amazon Web Services) e a IBM.
Para o professor de ciência da computação da Unicamp Marcelo Terra Cunha, por outro lado, o que falta é, justamente, um grande laboratório de referência, como o LNLS. “Precisamos colocar todas as pessoas com expertises diferentes em um mesmo lugar e o mesmo objetivo para avançar.”
A equipe da Amazon de computação quântica, por exemplo, reúne mais de cem cientistas de diferentes formações e origens, sob a coordenação de um brasileiro, dada a complexidade do projeto.
Hoje, o único grupo focado no desenvolvimento de um chip quântico é o Laboratório de Física de Dispositivos Quânticos, da Unicamp, coordenado pelo professor Francisco Rouxinol.
“Computação quântica é uma questão de soberania, os países na ponta da pesquisa já estão criando embargos” para restringir o acesso, disse o professor de computação da Unesp Felipe Fernandes Fanchini. “Não teremos o retorno que essas tecnologias podem trazer”, acrescentou.
“Já há mais 40 países com planos de investimento em computação quântica”, afirmou o diretor da Microsoft Brasil Waldemir Cambiucci.
A empresa, segundo ele, já tem programas avançados para usar a tecnologia em cibersegurança e IA. “Saímos do chamado inverno quântico, quando havia muitas dúvidas sobre as capacidades da tecnologia.”
“O Fórum Econômico Mundial registrou que há US$ 42 bilhões investidos em computação quântico no momento”, recordou.
De acordo com Rosa, do MCTI, o plano de computação quântica tem como objetivo estancar uma fuga de cérebros na área da tecnologia. “Precisamos virar esse jogo e começar a atrair talentos.”
“A ideia é fazer algo nos moldes do Pbia [Plano Brasileiro de Inteligência Artificial]”, emendou, em referência a um documento formulado por cientistas que o governo pretendia adaptar em decreto, mas acabou alocado sob outra rubrica —o Comitê Interministerial para a Transformação Digital (CITDigital). A versão original do Pbia indicava R$ 23 bilhões em infraestrutura até 2028.